A articulação do quadril é uma das mais complexas do corpo humano. Ela une o fêmur aos ossos da bacia, permitindo uma grande quantidade de movimentos (sentar, caminhar, agachar, etc.). No entanto, para que isso seja possível, são necessárias estruturas como ossos, cartilagens, músculos e ligamentos. A deformação de algumas delas pode levar à dor no quadril.
A síndrome do impacto femoroacetabular é um desses problemas. Nela, os ossos do quadril apresentam algumas alterações de formato. Geralmente, iniciadas na fase de crescimento, na infância. Isso leva a um encaixe imperfeito da articulação, promove atritos e impactos, podendo causar danos irreversíveis.
“A síndrome do impacto femoroacetabular é uma das principais causas de artrose do quadril, o desgaste da articulação. Os sintomas podem surgir em pessoas jovens e de meia idade. A videoartroscopia ajuda tratar a dor e pode prevenir o desenvolvimento da artrose do quadril.” Dr. Renato Locks, Ortopedista (CRM 16227 / RQE 8418).
Quanto mais precoce o tratamento, maiores as chances de combater os efeitos da artrose e de manter a qualidade de vida. Nesse texto, você vai conhecer o tratamento personalizado, feito pelos profissionais do Grupo de Quadril do Hospital SOS Cárdio, através da videoartroscopia de quadril no tratamento da síndrome do impacto femoroacetabular.
O que é a síndrome do impacto femoroacetabular?
O encaixe do fêmur nos ossos da bacia é feito em uma área chamada de acetábulo. Normalmente, para que os ossos não entrem em contato direto e venham a se desgastar, a região é revestida por cartilagens. Tanto o colo do fêmur (conhecido popularmente como a cabeça do fêmur) quanto o próprio acetábulo (o encaixe) possuem essa proteção.
“Uma das cartilagens mais importantes na articulação do quadril é o labrum. Ela fica ao redor da borda do acetábulo O labrum é responsável por manter a pressão negativa dentro da articulação, pela estabilidade e por distribuir o líquido sinovial, que lubrifica todo o sistema.” Dr. Renato Locks, Ortopedista (CRM 16227 / RQE 8418).
A síndrome do impacto femoroacetabular é provocada por deformidades anatômicas no fêmur, no acetábulo ou em ambos. Muitas vezes, os pacientes possuem o problema desde a infância ou adolescência, e com o tempo vão sofrendo microlesões. Um gesto mais forte pode completar o trauma e provocar sintomas em toda a região.
Os três principais tipos de impacto são:
- Impacto tipo CAM: nesses casos, o colo femoral (cabeça do fêmur) não é totalmente acinturado nem esférico. Assim, não consegue realizar movimentos suaves dentro da articulação. Algumas proeminências e calosidades ósseas podem causar impacto na borda do acetábulo, danificando as cartilagens.
- Impacto tipo Pincer: acontece por conta do excesso de tecido ósseo na borda do acetábulo. Com isso, em movimentos de flexão e rotação do quadril, o labrum pode vir a ser esmagado. Nessa situação, por ser uma estrutura bastante enervada, movimentos de flexão e rotação costumam provocar dor no quadril.
- Impacto misto: nele, tanto o colo do fêmur quanto o acetábulo possuem irregularidades. É o tipo mais comum, representando cerca de 80% dos casos.
Dor no Quadril
No primeiro estágio, o atrito constante das estruturas de formato irregular no quadril pode levar à condromalácia, que é o amolecimento e rugosidade das cartilagens. Se não for tratado, o problema pode evoluir para fissuras. Elas permitem que o líquido sinovial chegue até o osso. O surgimento de cistos na articulação pode gerar sintomas e é um dos sinais precoces de artrose.
Em estágios avançados, a cabeça do fêmur e os ossos do acetábulo entram em contato direto, sem a proteção das cartilagens. O desgaste pode ser bastante severo e provocar grande perda de mobilidade.
“A dor costuma aparecer aos poucos, como um leve desconforto, especialmente ao sentar e levantar. No início, ela pode ser confundida com uma dor muscular, mas tende a ficar mais intensa e constante. No geral, é uma dor profunda, que as pessoas não conseguem tocar.” Dr. Renato Locks, Ortopedista (CRM 16227 / RQE 8418).
As dores, contudo, não atingem apenas a articulação. O quadril é enervado por quatro grandes nervos. Dores nos joelhos, glúteos e virilha também podem estar relacionadas com a síndrome do impacto femoroacetabular.
Os pacientes nessa condição costumam apresentar:
- Tendinite na parte anterior da coxa e bursites de repetição;
- Dificuldades de alongamento, para cruzar as pernas, para levantar e agachar;
- Dor na virilha, glúteos e lateral da coxa.
Diagnóstico
A síndrome do impacto femoroacetabular pode dar os primeiros sintomas em pessoas jovens, com idades entre 25 e 35 anos, e comprometer gravemente a qualidade de vida. Por isso, o diagnóstico precoce é fundamental.
Geralmente, o médico especialista em quadril realiza exames físicos e faz um levantamento completo sobre os hábitos de vida e sintomas do paciente. Exames complementares de imagem, como Raio X, Tomografia Computadorizada e Ressonância Magnética, podem ser solicitados.
Técnicas modernas, que utilizam sensores e vídeo já estão sendo estudadas. Elas possibilitam analisar os movimentos em 3D. Em vez de examinar apenas uma articulação, o método permite compreender como todas as articulações do corpo trabalham durante certos movimentos, especialmente aqueles que levam ao impacto femoroacetabular.
“Algumas patologias no quadril podem ser descompensadas por alterações no comportamento motor, por exemplo. Isso deve ser identificado e tratado diferentemente. A descompensação de um dos segmentos da cadeia pode gerar um vício de movimento para a vida inteira.” Dr. Renato Locks, Ortopedista (CRM 16227 / RQE 8418).
Os novos métodos permitem conhecer melhor as causas da dor no quadril e os diversos problemas que podem potencializar a síndrome do impacto femoroacetabular. Assim, as indicações cirúrgicas ficam ainda mais seguras. O tratamento é personalizado, voltado para as necessidades e características motoras de cada paciente.
“Há casos em que os sintomas são intensos, mas o exame não identifica nenhuma disfunção motora. Isso mostra que o problema está mesmo na articulação do quadril e que a cirurgia é necessária”. Dr. Renato Locks, Ortopedista (CRM 16227 / RQE 8418).
Tratamento do Impacto Femoroacetabular
O tratamento para a síndrome do impacto femoroacetabular visa livrar o paciente dos sintomas. A prevenção da artrose e a manutenção da qualidade de vida também são dois objetivos centrais. Para isso, o diagnóstico e a abordagem precisam ser individualizados, de acordo com as necessidades de cada pessoa.
Nem sempre o paciente com impacto femoroacetabular será encaminhado para a cirurgia. No entanto, para os casos com lesões e deformidades estabelecidas, já existem técnicas cirúrgicas minimamente invasivas, que permitem ao médico remodelar os ossos em atrito e tratar lesões focais da cartilagem. O resultado costuma ser a melhora dos movimentos e da dor no quadril.
Videoartroscopia
Inicialmente, a cirurgia da síndrome do impacto femoroacetabular era feita por meio de uma incisão no quadril. Hoje, ela já pode ser feita através de uma técnica minimamente invasiva.
Na videoartroscopia de quadril, a equipe médica faz duas ou três punções pequenas na parte lateral do quadril do paciente. Por elas, são inseridas uma microcâmera de vídeo e os instrumentos necessários para acessar a articulação e remodelar os ossos.
“Nós identificamos com o paciente qual o esporte que ele pratica, quais são seus objetivos com a cirurgia, quais são as atividades que provocam dor e o que ele pretende fazer no futuro. A partir dessas informações, podemos traçar uma estratégia de tratamento para cada caso.” Dr. Renato Locks, Cirurgião Ortopedista (CRM 16227 / RQE 8418).
A cirurgia é realizada com anestesia geral e pode durar até três horas. Nela, os médicos testam todos os movimentos que causam impacto. É possível fazer também a sutura do labrum para uma posição adequada, que evite o contato. A reconstrução da estrutura através de enxertos, especialmente em pacientes jovens, também pode ser necessária.
Recuperação da Cirurgia de Quadril
A fisioterapia é muito importante no pós-cirúrgico da síndrome do impacto femoroacetabular. Nela, os pacientes realizam um trabalho de fortalecimento progressivo dos músculos que estabilizam a articulação do quadril – especialmente os glúteos. Evitam, assim, que a dor no quadril apareça durante a recuperação.
O médico deve analisar cada caso. Mas, no geral, as pessoas podem voltar para os trabalhos leves de escritório em seis semanas. Atividades intensas, como a corrida, devem ser evitadas em até 90 dias. Já atividades esportivas, como futebol e artes marciais, devem ser praticadas após, no mínimo, 6 meses da cirurgia.
Sobre o autor: Dr. Renato Locks (CRM 16227 / RQE 8418), Ortopedista, é especialista em Patologias do Quadril pelo Hospital Universitário Cajuru HUC-PUCPR (2011). Vencedor do Prêmio Internacional Jorge Paulo Lemann de Biomecânica e Cirurgia do Quadril 2016, participou do programa de 1 ano no Steadman Philippon Research Institute em Vail, no Colorado, Estados Unidos. Atuou com dedicação integral às pesquisas sobre a biomecânica das lesões complexas do quadril e as técnicas para o tratamento cirúrgico, sob coordenação do Dr Marc Philippon. Tem experiência na área de Ortopedia, com ênfase em ortopedia e traumatologia do quadril.